agosto 09, 2008

À JANELA DO FADO (Livro)

(continuação)

Mas ao falar-se em guitarristas, é bom lembrar, que o Porto se orgulha de ter sido o berço onde nasceu a guitarra portuguesa, instrumento de total importância e indispensável no acompanhamento da chamada canção nacional.
É impensável o fado sem guitarras, desiludam-se os que pensam o contrário.
Não existe instrumento mais completo e de suprema relevância para o fado que não seja a guitarra portuguesa.

É em 1796 que no Porto, o mestre capela António da Silva Leite, publica o seu “Estudo da Guitarra”, primeiro método de ensaio de guitarra, impulsionando a sua divulgação primeiro no Porto depois em Lisboa.
É assim que pela primeira vez aparece o nome guitarra, adaptação do cistro inglês (não confundir com sistro ou sistre) por seu turno derivado do cistro germânico e conhecido em Portugal por guitarra inglesa na época de D. João I, como escreve Pedro Caldeira Cabral, em: ( “A Guitarra Portuguesa, da colecção Um Século de Fado, editada pela Ediclube em 1999”).
Diz ainda este erudito e apaixonado da guitarra, que foram no Porto construídas as primeiras guitarras inglesas, pela mão e arte de Luís Cardoso Soares o “Sevilhano”no século XIV.

Contemporâneo de António da Silva Leite, foi o mestre Domingos José Araújo, que por Registo de Provisão do Príncipe Regente, em 27 de Fevereiro de 1804, lhe concede o direito de estabelecer fábrica em Braga.
É ainda no Porto, que nasce a casa Custódio Cardoso Pereira & Cª Lda. (Fundada em 1861) fábrica a vapor onde se construíam instrumente musicais.
Subsiste ainda desde 1870 a casa António Duarte Sucr., na rua Mouzinho da Silveira, 165 /167.

Mas no Porto, como diz o autor Mascarenhas Barreto em: (“ Fado Origens Líricas e Motivação Poética, Lisboa: Aster, s.d. 1969”).
O homem que dedicou toda a sua vida (mais de 60 anos) à construção de instrumentos de corda, chamava-se Domingos Cerqueira da Silva, nascido em Braga em 3 de Outubro de 1901. Seguindo as pisadas do avô e do pai, (que tiveram oficina no nº 399, bem perto onde ele exerceu o seu oficio, no 338 da Rua de Costa Cabral. Domingo Cerqueira suplantou-os como artista dotado que era. Trabalhou na casa Castanheira no Porto, onde desde 1926 se fixara, estabelecendo-se por conta própria em 1962.
A sua oficina transformou-se numa espécie de tertúlia dos instrumentistas portuenses, onde o mestre Domingos Cerqueira pontificava, rodeado de amigos, de ferramenta e sempre trabalhando. Homem simples e afável, o velho artesão foi um artista notável que construiu centenas de instrumentos de cordas, aos quais sempre imprimiu a sua marca de qualidade. Trabalhou para os E.U.A., Alemanha e África do Sul, quase sempre só, pois após a morte do irmão João, só teve a ajudá-lo um aprendiz em quem tentou, em vão, encontrar a continuidade da sua arte. Conta ainda Mascarenhas Barreto, que Domingos Cerqueira consciente do declínio da construção em Portugal de instrumentos de corda, procurou interessar a Fundação Calouste Gulbenkian na criação do ensino dessa arte em escolas industriais, mas o seu propósito nunca se concretizou, para mal de uma actividade que já teve grande prestígio entre nós. O artista portuense morreu com a mágoa de saber, talvez extinguir-se também a arte em que tanto se esmerou. Não esquecer que foi ainda Domingos Cerqueira, que suplanta a execução de volutas artísticas, encimando o braço da guitarra com arte de entalhador, o Dragão”.
Nesta pequena oficina da rua de Costa Cabral, o autor destas linhas com a idade de 15 anos, conheceu grandes instrumentistas da cidade que ali faziam tertúlia, levado por Eduardo Brandão, serrador de madeiras de profissão, fadista amador nas horas vagas e irmão do castiço fadista da Areosa, Joaquim Brandão.

É indiscutível a enorme prestação do Porto para o fado, mas voltando aos guitarristas: Diz ainda Pedro Caldeira Cabral em “A Guitarra Portuguesa”
(“O nome de António Coelho Júnior, (o Barbeirinho), nascido no Porto a 15 de Agosto de 1899, cidade onde veio a falecer em 6 de Abril de 1960. Este mestre da guitarra foi barbeiro em S. Roque da Lameira (lembro aqui a referência, ao culto da guitarra nas barbearias) foi célebre pelo facto de usar sempre as unhas naturais. Tocou música clássica e liderou um conjunto Portuense de instrumentos de corda (1920-1930), mais tarde surgia integrado noutro conjunto de nomeada, constituído por Alexandre Brandão e Lauro de Oliveira (guitarristas), José Severino e Arnaldo de Abreu (violas). O Barbeirinho foi também o autor do “Fado do Porto”, (Não confundir com a música do “Fado Porto” da autoria do cantador e guitarrista José Joaquim Cavalheiro Júnior), tendo sido um executante particularmente notado das variações sobre o Fado Robles e Fado João de Deus”).

Alves Rente, guitarrista e violista, também natural do Porto, deixou-nos um método de guitarra “sem mestre” que vem atestar a sua vocação para o ensino deste instrumento. Fez ainda parte do conjunto liderado por António Coelho Júnior o Barbeirinho.

Mas da grande leva de guitarristas que rumaram à capital e que aí fizeram carreiras notáveis (ainda na opinião de Pedro Caldeira Cabral), estacam-se nomes como:

José Nunes, nascido no Porto (Paranhos), em 28-12-1916 de seu nome completo José Nunes Alves Costa era filho do regente da banda militar do Regimento de Infantaria 18. Ainda na infância terá aprendido a dedilhar o Fado Menor com um sapateiro de Pereiró, mas a sua grande referência seria o já citado Barbeirinho, com o qual terá contactado na juventude.
Foi com oito anos para Lisboa, ingressando no Instituto dos Pupilos do Exército, onde concluiu o curso de técnico de electrotecnia.
A mãe muda-se para uma casa pertencente ao exército, mesmo no coração da mouraria, a zona mais fadista de então. Por esses anos, existia o hábito de certos cultores de fado e guitarradas, se reunirem numa taberna da Rua dos Cavaleiros, onde havia sempre uma viola e uma guitarra à disposição dos clientes. José Nunes passou a frequentar o lugar, vendo os seus méritos rapidamente reconhecidos, e pouco depois, em 1936, estreia-se como profissional no Café Mondego, ficando nove anos nessa casa, acompanhado por Alfredo Mendes. Mais tarde constituiria um grupo de guitarras com Casimiro Ramos, Alfredo Mendes e Pais da Silva, que actuou no Solar da Alegria.
Empregado como técnico na Companhia de Gás e Electricidade em 1946, trabalhou durante sete anos no Café Luso, onde seu estilo foi muito apreciado.
Foi dos primeiros guitarristas a actuar em directo na Rádio Graça e na Rádio Luso nos anos 30, tendo mantido um programa semanal de guitarras na Emissora Nacional, durante cerca de trinta anos. Em 1956 participou nas emissões experimentais da RTP, tendo mais tarde feito numerosas actuações em séries como O Fado Português (1972) e Fado Vadio (1979), transmitido já depois do seu desaparecimento.


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